Governo anuncia pacote de corte, volta da CPMF e fim de concurso público

Após um final de semana de muitas reuniões entre a presidente Dilma Rousseff e vários de seus ministros, o governo federal anunciou nesta segunda-feira (14) um bloqueio adicional de gastos no orçamento de 2016 no valor de R$ 26 bilhões. Além disso, o governo também está anunciando uma nova rodada de alta de tributos, com o retorno da CPMF. A CPMF, segundo os cálculos divulgados pelo governo, vai ser responsável por metade do ajuste nas contas públicas anunciado nesta segunda-feira paro ano de 2016, que é de R$ 64,9 bilhões. “O objetivo é que a CPMF não dure mais do que quatro anos”, disse Levy.

A decisão, que foi anunciada pelos ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, representa recuo em relação à posição adotada anteriormente. Na semana retrasada, Dilma havia dito que o governo cortou “tudo o que poderia ser cortado”.

“Muitas das medidas exigirão apoio do Congresso para se tornarem efetivas, e a confiança dos brasileiros. Foi sugerido que se procurasse dialogar mais com a sociedade para que tivesse pleno entendimento sobre a necessidade desse esforço adicional. Nestas últimas semanas, ficou absolutamente evidente para todos a necessidade desse ajuste. Temos os próximos meses para converter em realidade essas medidas, principalmente por meio da votação de projetos de lei e PECs”, declarou o ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

O ministro da Fazenda informou ainda que, ao atualizar os parâmetros do orçamento do ano que vem, baixando a previsão do nível de atividade, foi estimada uma perda de R$ 5,5 bilhões em arrecadação em 2016. A peça orçamentária do ano que vem trazia uma previsão de queda do PIB de 2015 de 1,8% e um aumento de 0,2% no próximo ano. Na semana passada, entretanto, o mercado financeiro previu uma contração do PIB de 2,55% neste ano e de 0,6% em 2016. Queda maior do PIB representa menos recursos no caixa do governo.
Volta da CPMF

O governo informou que vai propor o retorno da CPMF, com alíquota de 0,2%, inferior, portanto, aos 0,38% que vigoravam antes. Também informou que vai reduzir o Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF). Com isso, espera conseguir R$ 32 bilhões em 2016.

“Essa é uma medida bastante central no esforço. Foi considerada que, diante de todas as alternativas de tributos, a prorrogação da vigência da lei original da CPMF seria um caminho que traria menor distorção à economia, seria o caminho com menor impacto inflacionário, seria melhor distribuído. Incide de maneira equitativa em todos os setores. E, na verdade se a gente for pensar, tratam-se de dois milésimos do que [a pessoa] vai comprar. Você teria, por exemplo, dois milésimos de uma entrada de cinema que você comprar para diminuir o déficit da Previdência Social”, declarou o ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

Ele acrescentou que a CPMF seria “provisória”, mas não informou por quanto tempo ela teria validade. “Procuramos por essa alíquota no mínimo necessário para a segurança fiscal. Conhecemos essa medida. Essa contribuição é que os bancos estão preparados em implementar. É relativamente rápida, tem grande transparência. Alcança o informal. Depois de ouvir muitos empresários, essa seria a forma mais eficaz de proteger a Previdência Social em um momento em que a economia enfrenta dificuldades, que tem se agravado, com essa questão do grau de investimento”, disse o ministro da Fazenda.

Mais tributos
O governo informou ainda que diminuirá o benefício a ser concedido no próximo ano para os exportadores de produtos manufaturados. A alíquota do Reintegra, programa que “devolve” aos empresários uma parte do valor exportado em produtos manufaturados por meio de créditos do PIS e Cofins, que seria de 1% em 2016, será de apenas 0,1%. O benefício, portanto, foi praticamente eliminado no ano que vem. Com isso, o governo vai arrecadar R$ 2 bilhões a mais.

Também cairá o benefício dado à indústria química (por meio do PIS/Cofins), que renderá mais R$ 800 milhões ao governo. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, anunciou ajustes nos juros sobre capital próprio, limitando a incidência da TJLP a 5% do efeito do cálculo, e aumento da alíquota de 15% para 18%. Essa medida renderá mais R$ 1,1 bilhão aos confres públicos.
Imposto sobre ganho de capital.

O ministro anunciou ainda a criação de um imposto sobre “ganho de capital progressivo”, que será cobrado sobre aumentos de receita das pessoas físicas. Esse tributo vai afetar, por exemplo, os recursos gerados com a venda de um imóvel. Atualmente, há uma cobrança de 15% sobre o valor da venda da propriedade. Agora, o percentual será maior, conforme o volume de recursos gerados com a operação. O impacto estimado com o tributo é de R$ 1,8 bilhão. O novo imposto terá as seguintes alíquotas:

Para venda de até R$ 1 milhão será de 15% De R$ 1 milhão a R$ 5 milhões, será de 20% De R$ 5 milhões a R$ 20 milhões, será de 25% Mais de R$ 20 milhões, será de 30%.

“Como é um imposto novo isso leva uma mudança de hábitos. É difícil estimar as receitas. É um ganho de quando você aliena um bem. Hoje você paga 15%. Agora, quando houver vendas cumulativas acima de R$ 1 milhão, você pagará uma alíquota maior”, disse.

Sistema S
O ministro da Fazenda informou que vai “compartilhar temporariamente” com os órgãos do sistema S os estímulos hoje concedidos para empresas que investem em inovação. A expectativa é gerar um impacto positivo de R$ 2 bilhões.

“Hoje já temos alguns programas de valorização da inovação. Temos lá de trás a chamada lei do MEI, que permitia que várias despesas pudessem ser abatidas em dobro do custo do lucro tributado. Era um estímulo. No caso, estamos compartilhando esse estímulo pelos órgãos do sistema S, temporariamente”, disse.

Além disso, Joaquim Levy informou que haverá redução de 30% nas alíquotas do sistema S e do Sebrae e, também, oneração da tributação da contribuição previdenciária incidente sobre a folha – o que renderá mais R$ 6 bilhões aos cofres públicos em 2016. Na prática, esses recursos deixarão de ir para o Sistema S e passarão a ser direcionados para a Previdência Social.

Reajuste de servidores, concursos e DAS
Entre as medidas anunciadas, do lado do bloqueio de gastos, está o adiamento do reajuste do salário dos servidores públicos até agosto do ano que vem. Sem essa medida, os salários seriam corrigidos em janeiro de 2016. Com essa medida, o governo espera um impacto de R$ 7 bilhões a menos nos gastos públicos.

Além disso, também haverá suspensão de concursos públicos, que estavam estimados em R$ 1,5 bilhão em gastos em 2016. O governo anunciou ainda uma redução de R$ 2 bilhões em despesas discricionárias com DAS (cargos comissionados). Outras medidas anunciadas prevêem redução de ministérios (R$ 200 milhões a menos) e limites para gastos com servidores menores (R$ 200 milhões a menos também).

Teto salarial
O governo pretende ainda enviar ao Congresso projeto de lei para garantir o cumprimento do teto salarial a todos os agentes públicos e servidores.

Atualmente, a legislação já diz que a remuneração no setor público não pode ultrapassar o salário de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), mas alguns benefícios e complementações salariais acabam por aumentar o valor.

Segundo Nelson, o projeto de lei imporia limites a situações que hoje geram salário superior ao teto. “Vamos enviar um projeto de lei que vai disciplinar a metodologia de cálculo e o que entra ou não no teto de remuneração e ao mesmo tempo estabelecer um sistema de cruzamento de dados.”

Abono permanência
O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, anunciou que vai eliminar o chamado abono de permanência, que um benefício remuneratório pago a servidores que já atingiram a idade para se aposentar, mas que permanecem na função. A extinção do benefício tem que ser feita por proposta de emenda à Constituição.

“Vamos eliminar o abono de permanência. A previsão é que mais 123 mil servidores adquirirão nos próximos anos. No próximo ano, os gastos com o abono serão de R$ 1,2 bilhão de reais”, disse o ministro.

Minha Casa, Minha Vida, PAC e Saúde
O ministro do Planejamento anunciou que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) vai sofrer corte no trecho que trata do Minha Casa, Minha Vida, em R$ 4,8 bilhões.

“Para que isso não comprometa a execução do programa a nossa proposta é que o FGTS direcione recursos para pagamento de parte das despesas do Minha Casa, Minha Vida, na faixa 1, que hoje não recebe recursos do FGTS”, disse Barbosa.

Segundo ele, também está prevista uma renegociação de contratos de aluguel, manutenção e segurança, entre outros, para economizar mais R$ 1,6 bilhão no ano que vem.

Outra medida anunciada é a redução de gastos em R$ 3,8 bilhões do Programa de Aceleração do Crescimento (sem Minha Casa Minha Vida) e de mais R$ 3,8 bilhões em gastos com Saúde (a serem recompostos posteriormente com emendas parlamentares).

Objetivo das medidas anunciadas
O objetivo do novo bloqueio de gastos é tentar reequilibrar a peça orçamentária do ano que vem, que foi enviada ao Congresso Nacional, pela primeira vez, com déficit (despesas maiores do que receitas) e evitar novo rebaixamento da nota brasileira pelas agências de clasificação de risco. Na semana passada, o Brasil perdeu o grau de investimento da Standard & Poors.

Meta fiscal
Para aumentar a confiança no Brasil, o governo já informou que buscará, ao invés de uma meta de déficit fiscal de R$ 30,5 bilhões para o governo (0,5% do PIB) ou de R$ 21,1 bilhões para todo o setor público (governo, estados, municípios e estatais), ou 0,34% do PIB – conforme está no orçamento de 2016 – um superávit primário, a economia para pagar juros da dívida pública, de 0,7% do PIB no ano que vem.

A retomada de uma meta superavitária para o próximo ano, da ordem de 0,7% do PIB, acontece após disputas internas entre o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que defende um resultado positivo para as contas públicas em 2016, e o titular do Ministério do Planejamento, Nelson Barbosa – que buscava, com um déficit, uma meta mais “realista”.

Para se atingir essa meta de 0,7% do PIB, o governo informou que o esforço adicional, a ser implementado por meio de corte adicional de gastos e de aumento de tributos, é de R$ 64,9 bilhões – o equivalente a 1,1% do PIB.
Esse é o valor do esforço para sair de um déficit de R$ 30,5 bilhões para o governo, previsto no orçamento, e se atingir uma meta fiscal de 0,7% para todo o setor público no ano que vem.

Ajuste nas contas públicas
Neste ano, para tentar melhorar o perfil das contas públicas, o governo já anunciou uma série de medidas fiscais – principalmente de aumento de impostos, mas também de bloqueio de gastos e limitação de benefícios sociais.

Foram elevados tributos sobre empréstimos, cosméticos, importações, gasolina, carros, cerveja, refrigerantes, bancos, receitas financeiras das empresas, taxas de fiscalização de serviços públicos, vinhos, destilados, smartphones, computadores, tablets e exportações de manufaturados, entre outros.

Também foram promovidas limitações de benefícios sociais, como seguro-desemprego, auxílio-doença e pensão por morte, além de aumento da tributação sobre a folha de pagamentos. Todas estas medidas já passaram pelo crivo do Congresso Nacional e foram sancionadas pela presidente Dilma Rousseff.

Além disso, foram bloqueados quase R$ 80 bilhões no orçamento de 2015 – em relação aos valores aprovados pelo Congresso Nacional. Os investimentos, até o momento, foram o principal alvo dos bloqueios impostos pela equipe econômica neste ano.

Resultados fiscais
No ano passado, as contas de todo o setor público (governo, estados, municípios e empresas estatais) registraram o primeiro déficit primário (receitas menos despesas, sem contar juros) anual da história. Em 2014, o déficit primário foi de R$ 32,53 bilhões, ou 0,63% do PIB.

Em 2015, apesar dos vários aumentos de tributos e bloqueio de gastos públicos, as contas públicas continuaram a registrar deterioração. De janeiro a julho, foi contabilizado o pior resultado da série histórica, que começa em 2001, para este período. Em 12 meses até julho, houve um déficit primário de R$ 50,99 bilhões, ou 0,89% do PIB, também o pior resultado da série histórica para este indicador.

Quando se incorporam os juros da dívida pública na conta, no conceito conhecido no mercado como resultado “nominal”, houve déficit de R$ 502 bilhões em 12 meses até julho, o equivalente a expressivos 8,81% do PIB. Trata-se, também, do pior resultado da história. O déficit nominal foi impulsionado pelos gastos do Banco Central com os contratos de “swap cambial” – que já superam R$ 90 bilhões em 2015.

Se fechar neste patamar em 2015, o resultado nominal do Brasil só estaria em melhor situação da de países como Bahrein (déficit de 9,8% do PIB), Antigua (-10,5% do PIB), Algéria (-12,5% do PIB), Brunei (-15,6% do PIB), República do Djibuti (-13% do PIB), Egito (-11,7% do PIB), Guinea Equatorial (-21,4% do PIB), Eritreia (-12,18% do PIB), Guiné (-10,1% do PIB), Iraque (-9,9% do PIB), Líbia (-68% do PIB) e Venezuela (-19,9% do PIB), de acordo com projeções do Fundo Monetário Internacional.

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