Caririzeiro se torna doutor aos 24 anos: ‘minhas referências foram instituições públicas’, diz

Quatro anos e meio para uma graduação em medicina veterinária, no campus de Areia, na UFPB, 12 meses para concluir o mestrado e 25 meses para concluir o doutorado. Lucas Carvalho tem apenas 24 anos e já deu para perceber que ele precisa de pouco para conseguir muito. Ainda jovem, ele é o estudante mais novo a se tornar doutor na Universidade Federal da Paraíba, o berço dos seus estudos. Estudante também de escola pública durante infância e adolescência, são nessas instituições que ele encontra a base de tudo. “Minhas referências foram instituições de ensino público desde criança”, declara.

Natural de Serra Branca, interior da Paraíba, Lucas só tinha duas opções: a escola pública municipal e a escola pública estadual. Escolheu a Escola Estadual Senador José Gaudêncio, onde estudou até o 3º ano do ensino médio. Isso, claro, nunca foi um problema. Lucas nunca visualizou estudar em uma escola particular, porque não tinha essa opção como referência. No ensino médio, os pais ainda cogitaram colocá-lo em uma escola de Campina Grande, mas ele se apoiou na qualidade do ensino público que recebeu desde a infância. “No vestibular, 70% da minha turma foi aprovada”, conta.

Fez o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), se inscreveu no Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e passou para o curso de medicina veterinária em primeiro lugar no campus de Patos e em terceiro lugar no campus de Areia, pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). A universidade particular também não foi uma opção. Na época, nem existia o curso em instituições privadas. Terminou a graduação em quatro anos e meio e, para se formar, entrou com alguns processos na UFPB, porque estava adiantado em relação ao prazo.

Mas mostrando o resultado da aprovação do mestrado, em cuja seleção tirou nota máxima, conseguiu defender o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) no oitavo período do curso e concluir a graduação.

Filho de veterinário e com mãe dona de uma farmácia veterinária, Lucas não poderia crescer querendo outra coisa. Ainda na graduação, ajudava os pais nos fins de semana. Saía de Areia na sexta-feira, ia para Campina Grande estudar inglês e depois partia para Serra Branca. No sábado, trabalhava na farmácia, e no domingo, fazia as cirurgias na clínica veterinária. Quando terminou o terceiro ano do ensino médio, queria seguir o caminho dos pais e tocar o negócio da família. Mas quando conheceu a pesquisa e o magistério, não teve dúvidas do que realmente gostaria de fazer.

‘Quero devolver de alguma forma, sendo professor’

Lucas ainda pensou em seguir a carreira dos pais e tocar o negócio da família. Mas quando entrou na universidade e conheceu o mundo da ciência, visualizou um novo caminho. Trabalhou bastante na graduação para fazer um bom currículo acadêmico e foi isso que o colocou no mestrado tão cedo. Em doze meses conseguiu concluir a dissertação na pós-graduação em ciência animal, também no campus da UFPB em Areia.

Foi durante o curso que o pesquisador conseguiu se destacar mais uma vez no universo acadêmico por ter desenvolvido, junto com uma equipe do Laboratório de Histologia Animal da Universidade, um aplicativo – Histologia Fácil –, para o qual foi realizado o depósito de patente pela Agência UFPB de Inovação Tecnológica (Inova), em 2019.

Findado o mestrado, conheceu o professor Valdir Braga, atual pró-reitor de Pesquisa (Propesq) da UFPB, e seguiu para João Pessoa onde deu andamento ao doutorado em ciências fisiológicas. Vivendo um passo de cada vez, para se sustentar, Lucas conseguiu um emprego como professor de uma universidade particular. Assim, unia a profissão com a academia e, também em tempo mínimo, terminou o doutorado em 25 meses.

Tudo muito rápido porque Lucas quis agarrar todas as oportunidades que surgiram. O professor Valdir buscou todas as informações necessárias e deixou para Lucas apenas a decisão: fazer um pós-doutorado na Suécia? Sim. O curso é na universidade Karolinska Institutet, com a qual fez parceria durante a pesquisa de doutorado.

Agora, de malas prontas para embarcar, vai com a esposa, Maryanne, e o filho, Artur, de apenas nove meses, para Estocolmo, onde passará pelo menos dois anos, e espera retornar ao Brasil e à universidade onde sua trajetória de sucesso teve início. Mas, dessa vez, como professor.

“Eu nunca visualizei ter que pagar para estudar, sempre visualizei que o governo e o estado faziam isso para mim, e eu sou muito grato. Eu quero devolver isso de alguma forma, sendo professor, devolver todo o investimento que foi feito em mim. Eu sou muito grato por esse investimento e pelo incentivo à educação pública. Falando como pesquisador, são as instituições públicas que dominam as pesquisas no Brasil, pesquisas de ponta e de qualidade. A pandemia serviu também para mostrar a importância do cientista e como a ciência está por trás do avanço da sociedade. É dentro dos muros da universidade que a gente faz isso”, declarou Lucas.

Em isolamento na cidade de Sumé, o pesquisador aguarda apenas a resolução final dos trâmites para seguir para Estocolmo. Passagens compradas, malas prontas, Lucas vai dar mais um passo na sua vida: pós-doutorado fora do país, aos 24 anos, seguindo o rumo que o destino ditou.

 

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